JK e a Revolução sobre Rodas
Por Mario Garnero *
Tive o privilégio de ouvir do presidente JK e do
ministro Lúcio Meira, que criaram a indústria automobilística, uma
fascinante história daquilo que representou o grande salto para a
frente no desenvolvimento nacional.
Histórias que demonstram como JK, ao criar os
grupos de trabalho encarregados de cumprirem as metas do seu plano,
driblou a burocracia nacional, já desde o império consolidada, e
encontrou homens do caráter e competência do almirante Lúcio Meira
para chefiar o Geia – Grupo Executivo da Indústria
Automobilística.
No planejamento de sua implantação, o caminhão
seria o primeiro e primordial instrumento da penetração para as
estradas que seriam abertas, ligando a futura capital Brasilia a
todos os mais remotos pontos do país. Depois viriam os automóveis
e, por último, os tratores, tudo isto em quatro anos que, ao seu
final, viram a caravana da integração nacional unir o país de
ponta a ponta com carros e caminhões made in Brazil.
Desta saga, da qual participaram todas as empresas
que, na época, eram as maiores fabricantes mundiais de veículos,
uma faltou. A Fiat, que depois se redimiria lançando o primeiro
carro cem por cento movido a álcool, em julho de 1979.
E um curioso episódio. Já na campanha
presidencial JK 65, que eu coordenava em São Paulo, organizei uma
visita do presidente`a Fiat, em Turim.
Recebidos pelo presidente Vittorio Valetta, que
havia reconstruído a empresa no após guerra, e por Gianni Agnelli,
só então membro da diretoria, durante o almoço JK perguntou:
Presidente Valetta, porque apenas a Fiat, dentre
as mais importantes empresas produtoras de veículos do mundo, não
atendeu ao meu chamado para instalar-se no Brasil?
E Valleta respondeu: Presidente, a colônia
italiana na Argentina era muito mais influente e forte que a
brasileira e nos empurrou para lá.
E se arrependimento matasse, anos depois Gianni
Agnelli, já na condição de presidente da empresa, corrigiu o tiro
investindo mais de um bilhão de dólares na construção de uma
fábrica de veículos que se instalou, pela força política dos
mineiros e com participação societária do governo estadual, na
cidade de Betim. A fábrica da Fiat foi inaugurada em julho de
1976 e seu primeiro produto foi o compacto Fiat 147.
Coube a mim, em 1983, negociar com o então
governador Tancredo Neves o acordo final que, permitindo a recompra
dos ações do governo pela Fiat contra o pagamento de créditos
fiscais acumulados, pode dar asas livres para a sua expansão
vitoriosa no país, líder que é, atualmente, do concorrido mercado
automobilístico brasileiro.
Lúcio Meira foi, por 10 anos, meu companheiro de
diretoria no Grupo Monteiro Aranha, no Rio de Janeiro. Amável,
discreto, decisivo e grande trabalhador foi o primeiro chefe do Geia
e o absoluto responsável pelo êxito da meta estabelecida por JK de
dotar o país continente de meios de transportes modernos e
eficientes.
Vencer a batalha de trazer as multinacionais para
um país ainda carente de estradas, de energia, de aço, de mão de
obra qualificada, de processos de produção e gestão foi um grande
desafio.
Desde a sua criação, por decreto, em junho de
1956, até o final do governo JK, em 1960, mais de 300.000 carros,
caminhões e tratores foram produzidos a partir de um sonho tornado
realidade.
Desse mesmo sonho desfrutei quando, indicado pelos
doutores Olavo de Souza Aranha e Joaquim Monteiro de Carvalho, que se
associaram ao sonho desde o início detendo participação societária
de 20% do capital inicial da Volkswagen do Brasil, fui indicado em,
1970, para assumir a diretoria de relações industriais da VWB e,
depois, por indicação de Rudolf Leiding, então presidente no
Brasil e mais tarde presidente mundial da VW, assumi a presidência
da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores –
Anfavea. E daí nasceu o carro a álcool.
* Mario Garnero é presidente do conselho do Grupo
Garnero, controlador das empresas Brasilinvest S/A, empresário,
político, diplomata, patrono das artes, filantropo.