quinta-feira, 7 de fevereiro de 2013

A Imensa Imoralidade da Existência


Viver era como correr em círculo num grande labirinto, esse género de labirinto para crianças que se vê em certos parques de jogos modernos; em cima de uma pedra no meio do labirinto há uma pedra brilhante; os míudos chegam com as faces coradas, cheios de uma fé inabalável na honestidade do labirinto e começam a correr com a certeza de alcançarem dentro de pouco tempo o seu alvo. Corremos, corremos, e a vida passa, mas continuaremos a correr na convicção de que o mundo acabará por se mostrar generoso para quem correr sem desãnimo, e quando por fim descobrimos que o labirinto só aparentemente tende para o ponto central, é tarde demais - de facto, o construtor do labirinto esmerou-se a desenhar várias pistas diferentes, das quais só uma conduz à pérola, de modo que é o acaso cego e não a justiça lúcida o que determina a sorte dos que correm.
Descobrimos que gastámos todas as nossas forças a realizar um trabalho perfeitamente inútil, mas é muito tarde já para recuarmos. Por isso não é de espantar que os mais lúcidos saiam da pista e suprimam algumas voltas inúteis para atingirem o centro cortando caminho. Se dissermos que se trata de uma acção imoral e maldosa, não devemos esquecer que a imoralidade de um homem não poderá, nunca por nunca ser, competir com o malefício da ordem do mundo cujas engrenagens bem oleadas funcionam sempre na perfeição. Temos, por um lado, um desespero que se incendeia rapidamente assumindo formas cada vez menos equilibradas e, por outro lado, uma consciente imoralidade de reflexos metálicos e glaciais, orgulhosa do seu gelo e do seu fulgor.

Stig Dagerman, in 'A Ilha dos Condenados'

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