Socialismo para milionários
Por Marcos Troyjo
Pego emprestado título de um livro de Bernard
Shaw para esta coluna. A frase é perfeita para descrever o atual
frenesi em torno da dualidade "crescimento-desigualdade".
Duas investidas recentes acirram o debate. A
primeira é o Índice de Progresso Social (IPS), que busca aferir o
desenvolvimento relativo dos países sem utilizar o referencial do
PIB. A segunda, a acalorada recepção ao "Capital no Século
21", de Thomas Piketty.
A repercussão de ambos é multiplicada, na Europa
e nos EUA, pelos traumas não curados da Grande Recessão –sobretudo
as elevadas taxas de desemprego.
Tanto o IPS quanto o "Capital" de
Piketty apontam para a prevalência do investimento social "para
além do crescimento da economia". Convidam a retomar a questão
da moralidade do capitalismo. Repisam (sobretudo em Piketty) a
desproporção nas remunerações a capital e trabalho como principal
obstáculo ao bem-estar social.
De acordo com esses apontamentos, a desigualdade,
mal maior do capitalismo, poderia remediar-se com maior carga
tributária e mais investimentos "no social".
Sem entrar demais nos altos e baixos do IPS ou de
Piketty, minha percepção é que ambos devem interessar mais a
países avançados do que a nações em desenvolvimento. É papo para
ricos.
Dos países que ocupam as 20 primeiras posições
do IPS (em que supostamente o PIB não conta), todos apresentam renda
per capita anual superior a US$ 30 mil. Ainda assim, mesmo para os
que já se desgarraram da armadilha da renda média, como sustentar
amplo acesso a educação e saúde pública sem crescimento ao longo
do tempo?
Nesse contexto, o atual debate sobre desigualdade
reflete, de ponta-cabeça, a binária consideração de "crescimento"
ou "austeridade" como alternativas para países em crise de
dívida soberana, caso da Europa mediterrânea em 2011.
Há mérito na crítica à inércia
patrimonialista no Ocidente. As soluções
tributário-distributivistas apontadas por Piketty, contudo, não
tratam de questão –importante o suficiente para os ricos– e
absolutamente essencial para países em desenvolvimento. Que padrão
de economia política adotar para, ao final do dia, gerar excedentes
que custeiem os trampolins sociais?
Decepciona, em Piketty, não ver referência a
"empreendedorismo", "competitividade",
"start-ups", "papel da inovação", ou à
"destruição criativa" de Schumpeter.
A principal tensão do mundo contemporâneo não
advém do conflito distributivo entre capital e trabalho. O cabo de
guerra é entre empreendedores e burocratas, seja na forma da grossa
camada de gestores cujo intuito é a autopreservação ou nas
inúmeras esferas estatais que esclerosam o dinamismo econômico.
Para países como o Brasil, o grande desafio é
encontrar seu próprio modelo de capitalismo competitivo que o
permita pagar o preço da civilização.
Deixemos para amanhã manuais de instalação de
um "Welfare State 2.0", como o IPS ou o tijolo de Piketty.
Concentremo-nos, agora, nas lições de Acemoglu e Robinson em "Por
que as Nações Fracassam".
Nenhum comentário:
Postar um comentário