Publicado no Estadão deste domingo
O Brasil teve um segundo trimestre quase chinês, segundo a comparação
do ministro da Fazenda, Guido Mantega. A exibição de entusiasmo foi
breve, mas com alguma base aritmética. A economia chinesa cresceu entre
abril e junho em ritmo equivalente a 6,9% ao ano. No mesmo período, o
Produto Interno Bruto (PIB) brasileiro aumentou 1,5%. Em quatro
trimestres isso resultaria numa taxa acumulada de 6,1%.
Mas a semelhança termina aí. A China cresceu durante anos a taxas
próximas de 10%. O impulso diminuiu nos últimos tempos, em parte porque o
governo decidiu remodelar a economia e dar mais peso ao mercado
interno, mas, a expansão deve continuar acima de 7% em 2013 e em 2014.
Por aqui, o panorama tem sido muitíssimo diferente. Depois de
aumentar apenas 2,7% em 2011, a produção brasileira avançou 0,9% no ano
passado. Para 2013, o ministro Guido Mantega se absteve de apresentar
uma projeção e anunciou um 2014 “mais promissor”. O paralelo com a China
foi abandonado rapidamente. Mas a fala otimista foi mantida e reforçada
com a apologia da política econômica.
O ministro mostrou especial entusiasmo em relação à retomada do
investimento. A economia, segundo ele, está crescendo “com qualidade”. O
valor investido em máquinas, equipamentos, construções e obras de
infraestrutura aumentou 3,6% em relação ao primeiro trimestre e foi 9%
maior que o de igual período do ano passado. O total dos primeiros seis
meses foi 6% superior ao do primeiro semestre de 2012 ─ um belo
resultado ─, mas o acumulado em 12 meses cresceu apenas 0,2%.
A recuperação do investimento ocorreu, portanto, sobre uma base muito
baixa, até porque o valor investido no ano passado foi 4% menor que o
de 2011. Além disso, mesmo com a recuperação, o País investiu no segundo
trimestre apenas 18,6% do Produto Interno Bruto. Entre abril e junho do
ano passado havia ficado em 17,9%. A maior taxa alcançada num segundo
trimestre, nas últimas duas décadas, foi de 19,2%, em 2010. Em economias
latino-americanas mais dinâmicas o valor aplicado em capital fixo
(máquinas, equipamentos, etc.) tem atingido e até superado 25% do PIB
(acima de 27% na Colômbia, por exemplo). Os 24% ou 25% indicados pelo
governo como objetivos razoáveis para o Brasil continuam muito
distantes.
Quanto a esse aspecto, só com uma dose excepcional de boa vontade se
pode falar de crescimento com qualidade. Por enquanto, não há nada além
de uma recuperação. Além disso, boa parte das máquinas e equipamentos
comprados neste ano foi de caminhões e bens de produção destinados à
agricultura. Há um vínculo claro entre esse detalhe e o desempenho do
setor rural. No segundo trimestre, a produção da agropecuária cresceu
3,9% em relação ao primeiro e foi 13% superior ao de um ano antes. O
resultado do primeiro semestre foi 14,7% maior que o de janeiro a junho
de 2012 e a expansão acumulada em 12 meses chegou a 7,4%.
O crescimento industrial no primeiro semestre ficou em 0,8% e a
produção em quatro trimestres foi apenas 0,1% maior que a do período
anterior. O número do segundo trimestre, 2% maior que o de janeiro a
março, pode ser uma boa notícia, mas a atividade industrial continua
medíocre em 2013. Em quatro trimestres a indústria de transformação
cresceu apenas 0,4%. Os dados de julho da indústria paulista, divulgados
pela Federação das Indústrias do Estado de São Paulo (Fiesp), indicaram
um nível de atividade (INA) 1,6% mais baixo que o de junho, descontados
os fatores sazonais, e 4% mais alto que o de julho do ano passado. Mas o
aumento do INA em 12 meses ficou em 1,7%. O ano está comprometido,
disse o diretor do Departamento de Pesquisas e Estudos Econômicos da
entidade, Paulo Francini.
Os números do segundo trimestre mostram 0 acerto da política
econômica, segundo o ministro da Fazenda. Mas nem ele ousa projetar para
2013 um crescimento razoável para o PIB. Essa hesitação contrasta com a
apologia das medidas oficiais. Fora do governo talvez seja mais fácil
vê-las como são: uma política fracassada.
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