Por Marcos Troyjo
O Brasil tem de alimentar sua elite de talentos para que não
fique à margem da definição dos rumos globais
Armas, recursos naturais, produção tecnoindustrial,
influência da cultura. Critérios tradicionalmente elencados para estabelecer se
um país tem mais ou menos poder. Desponta, no entanto, novo e determinante
fator: consolida-se uma nova Era do Talento.
Não é recente a percepção de uma guerra global por talento.
Este, contudo, era tido como sinônimo de vocação. Cabia desenvolver aptidões
naturais ou nichos. Idealizávamos indivíduos "especialistas",
companhias com "core business", países com "vantagens comparativas".
Em 2008, Malcolm Gladwell popularizou em
"Outliers", seu best-seller de alta vulgarização sobre o DNA do
sucesso, a "regra das 10 mil horas". O talento emergiria da devoção
de tal estoque de tempo a atividades tão distintas como tocar violoncelo ou
programar computadores. Quanto mais cedo começar, melhor. Dessa disciplina
surgiram Yo-Yo Ma e Bill Gates.
A reglobalização que agora chega prenuncia a
pós-especialização. Há seis anos, computação em nuvem, tablets e seu
ecossistema de aplicativos eram incipientes. Hoje permitem um atalho da
história. É possível compactar as 10 mil horas. Novas tecnologias catalisam
talento.
Assim, pessoas, empresas e nações têm de ser multifuncionais
e complexas. Engenheiros que escrevem bem. Agronegócio preocupado com design.
Países produtores de petróleo transformando-se em "hubs" de
entretenimento.
Já existem métricas para delinear essa nova Era do Talento.
Harvard elaborou um "Atlas de Complexidade Econômica". Avalia o
impacto do talento (ali chamado de know-how) sobre renda e crescimento. Não
importa o número de horas-aula a que foi exposto determinado aluno, mas o que
consegue fazer pragmaticamente com o que aprendeu. É, portanto, umbilical a
relação entre atitude empreendedora e talento no êxito de empresas e nações.
O Insead também formulou seu "Índice de Competitividade
do Talento Global". Na pesquisa, que envolve 103 países e 96% do PIB
mundial, o Brasil ocupa a 59ª posição.
As razões do fraco desempenho extrapolam o ensino deficiente
ou o PIB destinado à inovação (apenas 1%). Estatismo, baixa conexão a mercados
globais, predileção de jovens por concursos públicos e a mentalidade vigente na
maioria das universidades brasileiras de não "submeter-se à lógica do
mercado" são inibidores de talento.
Surge assim um duplo desafio. Se falamos em parâmetros além
das 10 mil horas, que dizer dos que, no início da idade adulta, sequer têm mil
horas de foco em aptidões?
Os brasileiros nascem com expectativa de viver 75 anos. Sem
o potencial do talento, terão pouca utilidade à economia do conhecimento. Serão
contudo "úteis", e durante bastante tempo, ao tráfico de drogas, à
pirataria e às manifestações mais virulentas do lumpesinato urbano.
E, na ponta mais sofisticada, o Brasil tem de alimentar sua
elite de talentos para que ela própria não seja crescentemente marginalizada da
redefinição dos rumos globais.
P.S.: Parabéns ao CIEE, Centro de Integração Empresa-Escola,
por 50 anos de lapidação de talentos no Brasil.
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