Por Kátia Abreu *
Conspiração, teoria e prática
Há um projeto em curso, que quer restringir e relativizar a
propriedade privada e a economia de mercado
"Teoria da conspiração" tornou-se uma espécie de
mantra para banir qualquer avaliação mais profunda da conjuntura política. O
termo é invocado mesmo quando já se está diante não de uma tese, mas da própria
prática conspirativa.
Os fatos estão aí: há um projeto em curso, que pretende
restringir e relativizar a propriedade privada e a economia de mercado. Em
suma, o Estado democrático de Direito. O setor rural é o mais visado.
Usa-se o pretexto da crise social para invasões criminosas a
propriedades produtivas: sem-terra, quilombolas e índios têm sido a massa de
manobra, incentivada por ativistas, que, no entanto, não querem banir a
pobreza.
Servem-se dela para combater a livre iniciativa e estatizar
a produção rural. Espalham terror nas fazendas e, por meio de propaganda,
acolhida pela mídia nacional, transformam a vítima em vilão. Nos meios
acadêmicos, tem-se o produtor rural como personagem vil, egoísta, escravagista,
predador ambiental, despojado de qualquer resquício humanitário ou mesmo
civilizatório.
No entanto, é esse "monstro" que garante há anos à
população o melhor e mais barato alimento do mundo, o superavit da balança
comercial e a geração de emprego e renda no campo.
Nada menos que um terço dos empregos formais do país está no
meio rural, que, não tenham dúvida, prepara uma nova geração de brasileiros,
apta a graduar o desenvolvimento nacional.
Enfrenta, no entanto, a ação conspirativa desestabilizadora,
que infunde medo e insegurança jurídica, reduzindo investimentos e gerando
violência, que expõe não os ativistas, mas sua massa de manobra, os inocentes
úteis já mencionados.
Vejamos a questão indígena: alega-se que os índios precisam
de mais terras.
Ocorre que eles --cerca de 800 mil, sendo 500 mil aldeados--
dispõem de mais território que os demais 200 milhões de compatriotas. Enquanto
estes habitam 11% do território, os índios dispõem de 13%. Não significa que
estejam bem, mas que carecem não de terras, e sim de assistência do Estado, que
lhes permita ascender socialmente, como qualquer ser humano.
Mas os antropólogos que dirigem a Funai não estão
interessados no índio como cidadão, e sim como figura simbólica. Há o índio
real e o da Funai, em nome do qual os antropólogos erguem bandeiras
anacrônicas, querendo que, no presente, imponham-se compensações por atos de
três, quatro séculos atrás.
O brasileiro índio do tempo de Pedro Álvares Cabral não é o
de hoje, que, mesmo em aldeias, não se sente exclusivamente um ente da
floresta, mas também um homem do seu tempo, com as mesmas aspirações dos demais
brasileiros.
Imagine-se se os franceses de ascendência normanda fossem
obrigados pelos de descendência gaulesa a deixar o país, para compensar
invasões ocorridas na Idade Média. Ou os descendentes de mouros fossem
obrigados a deixar a Península Ibérica, que invadiram e dominaram por oito
séculos.
A história humana foi marcada por embates, invasões e
violência. O processo civilizatório consiste em superar esses estágios
primitivos pela integração. O Brasil é um caudal de raças e culturas, em que o
índio, o negro e o europeu formam um DNA comum, ao lado de imigrantes mais
tardios, como os japoneses.
Querer racializar o processo social, mais que uma heresia, é
um disparate; é como cortar o rabo do cachorro e afirmar que o rabo é uma coisa
e o cachorro outra.
A sociedade brasileira está sendo artificialmente desunida e
segmentada em negros, índios, feministas, gays, ambientalistas e assim por
diante. Em torno de cada um desses grupos aglutinam-se milhares de ONGs,
semeando o sentimento de que cada qual padece de injustiças, que têm que ser
cobradas do conjunto da sociedade.
Que país pretendem construir? Não tenham dúvida: um país em
que o Estado, com seu poder de coerção, seja a única instância capaz de deter
os conflitos que ele mesmo produz; um Estado arbitrário, na contramão dos
fundamentos da democracia. Não é teoria da conspiração. É o que está aí.
* KÁTIA ABREU, 51, senadora (PMDB/TO) e presidente da CNA (Confederação
da Agricultura e Pecuária do Brasil), escreve aos sábados nesta coluna.
Nenhum comentário:
Postar um comentário